Um Segundo Domingo de Maio

Veridiana Avelino
3 min readMay 9, 2021

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Imagem: @lifeonadraw

Acordo com os sons reconfortantes da cozinha

Com certeza, a senhora já foi comprar pão e outros itens de padaria, que das prateleiras, sempre a conquistaram

Um cheirinho de café fresco me abraça como um bom dia.

Levantas muito cedo e vais para o quintal aguar suas plantas, cuidar das rosas, dos cachorros e gatos, que não são poucos.

Sempre incansável, não importa se é o dia das mães, sua rotina de domingo sempre é a mesma:

Colocas a roupa para lavar, cuidas da casa, cuidas de nós…

O que fazemos não é nada diante da grandeza de suas atitudes

Sem sua presença, sempre soubemos, nossa vida ficaria sem prumo.

Sentamos todos na mesa, mas estás inquieta, andas para lá e para cá, sempre ocupada

“Mãe, senta”. _ Pedimos, mas a resposta é a mesma, que não tens tempo

Depois de certa insistência, sentas conosco, sua prole. Mastigas um pedaço de queijo coalho grelhado.

Em poucos minutos, tu se levantas dizendo que tens algo para fazer.

“É seu dia mãe”…

A verdade é que o dia delas é todo dia. São as pessoas mais importantes de nossas vidas, sem as quais, nem existiríamos.

Como eu sempre gostei de cozinhar, vou para a cozinha fazer algo diferente.

Mas vens… Fiscalizando-me ou espiando com o rabo do olho, simplesmente.

Sons de televisão, sons de conversa, sons de telefones

Cheiros da cozinha, cheiro da casa limpa, cheiros de vida

Tons dos seus paninhos artesanais na mesa e balcões, de suas roupas de flores coloridas e das telhas marrons, que aqui e acolá, se abrem como um portal para a luz do sol entrar

Sensação de calor, de afago, de risos e abraços, da voz materna…

São essas impressões que sinto tanta falta e por isso, carrego-as comigo

As lembranças eclodem em minha mente, não só hoje, mas rotineiramente

São lembranças de um tempo bom que não volta

Memórias dos melhores anos de minha vida.

Relembro também dos nossos últimos momentos:

Fiz suas unhas, pois sabia o quanto eras vaidosa, à sua maneira

Conversamos tanto, e embora não recebesse suas respostas, eu sabia que estavas me ouvindo.

Tentei lhe tranquilizar, para que pudesse partir em paz.

Comecei a lhe dar um banho com uma compressa umedecida em água morna.

Fui passando-a em seu corpo, agora frágil.

Era mais uma carícia, a derradeira.

E antes que esse banho terminasse, vi sua vida se esvaindo, lhe deixando, me deixando…

Era o que mais tinha pedido à Deus: para não vivenciar sua partida.

Mas por alguma razão, era eu quem estava lá.

E por pensar que esse instante acabaria comigo… Ah, eu tinha muito medo.

Incrivelmente, aquele momento de alguma forma me fortaleceu

E me senti privilegiada de ser seu último toque, de ser a última voz que a senhora ouviu, sua última companhia,

Como sempre procurei ser.

E por mais que eu chore de saudades, algo me conforta

Pois sabemos que não foi um adeus e sim, um até logo.

Obrigada por tudo.

Feliz dia das mães para todas as mamães desse mundo!

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Veridiana Avelino

Leitora voraz e também escritora. Gosto de viver, conhecer lugares, experimentar sabores, sentir o cheiro das coisas. Ver esse mundo que Deus criou!